segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

A piscina de livros

Na onda de obras que inundou minha casa, descobri com o Mágico de Oz que crescer é uma aventura e tanto

Eu tinha 10 anos quando li O Mágico de Oz dentro da piscina. Tudo bem que era uma piscina de livros, mas ainda assim...
A história foi a seguinte: minha mãe, que era professora da UFMG, fez uma campanha de arrecadação de livros e gibis usados para distribuí-los em creches e asilos de belo Horizonte. Um belo dia, acordei e topei com um caminhão despejando toneladas de livros na entrada de casa. O hall virou uma piscina de livros e ali eu mergulhei, nadei e me diverti durante dias.
Comecei a ler O Mágico de Oz ali mesmo e não saí da piscina até terminar. Não era a versão integral, de L. Frank Baum, que só fui conhecer anos depois, mas uma adaptação em formato de bolso que guardo até hoje. Quem é da minha geração deve se lembrar com carinho das “Edições de Ouro”, que soltavam páginas com facilidade, mas mesclavam ótimas histórias brasileiras e adaptações muito bem feitas.
Na minha cabeça, Dorothy desenhou-se muito mais jovem do que fui encontrar no filme com Judy Garland. Como parecia frágil aquela menina morando em uma casa tão pequena: “Eram só quatro paredes, o assoalho e o teto, isto é, um único aposento, contendo um fogão velho, um guarda-louça, a mesa, três ou quatro cadeiras e as camas. Tio Henry e Tia Em dormiam na cama grande, a um canto, e Dorothy, numa pequenina, no lado oposto do aposento”. No rodapé, vinham explicações para palavras difíceis: “longínquo recanto = lugar afastado”, “terríveis ciclones = ventos fortes”.
E quando veio o vento forte eu me senti tão desamparado quanto Dorothy. Felizmente, o ciclone deposita a casa no chão com delicadeza – “para um ciclone, é claro” – num cenário deslumbrante. E ali ela vai descobrir que crescer é uma aventura e tanto, uma viagem que mistura emoções e desafios, dúvidas e perigos. A menina arrebanha o Espantalho sem cérebro, o Homem de Lata, o Leão covarde e enfrenta a bruxa, além do sinistro “Mágico de Oz – que de sinistro não tem nada; por trás de toda a panca, é um sujeito tão inseguro e gentil quanto os amigos da menina.
Quem diria que, tantos anos depois, eu encontraria O Mágico de Oz na piscina outra vez? Agora a piscina cabe na palma da mão e se chama iPhone, iPade. Mas continua cheinha de livros, à espera de mergulhos.

Fonte: Revista Carta Fundamental, Texto de Leo Cunha

Nenhum comentário:

Postar um comentário