segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Semeador de versos

Nicolas Behr não escolheu entre mudas e letras: soube conciiliar as duas paixões como partes essenciais de sua rotina 

As mãos pequenas do menino Nicolas Behr eram guiadas pela mãe em meio à mata da fazenda onde moravam em Cuiabá, na década de 1960. Às mesmas mãos, eram apresentadas frutas e sementes, que, logo, se enraizariam no garoto. Tanto que, na juventude em Brasília – para onde a família se mudou em 1974 -, a intimidade com o verde ganhou a forma de saquinhos de leite com mudas de árvores típicas da região. Algumas iriam para as terras dos pais, outras seriam vendidas. O hobby, no entanto, repousou à sombra de uma jaqueira quando Nicolas aprendeu, nas aulas de português, o significado da expressão “licença poética”. Desde então, a poesia virou mais uma semente. “Ela foi uma forma de dialogar com a cidade”.
Antes, como muitos garotos, o que ele queria mesmo era ser guitarrista, baixista, cantor ou baterista de uma banda de rock. “Só que não tenho o tal ouvido musical. Por isso fui pelo caminho da poesia. Só preciso de papel, lápis e imaginação”. Graduado em publicidade, exerceu por pouco tempo a profissão, até enveredar como ambientalista em diversas ONGs. Pouco depois, já nos anos 90, se dedicou à venda de mudas nativas, tornando-se um dos pioneiros em comercialização de plantas do cerrado. Desde então, aquela lembrança de cidade nua de árvores, habitada por linhas retas e curvas, se transformou em tema frequente dos livros de Behr, reconhecido como o poeta de Brasília, por tê-la como musa.

Além da literatura, Behr trabalha como sócio e proprietário de um viveiro. É que, além de ser botânico amador, os versos de Nicolas brotam do chão. Nesse ritmo, ele segue com os pés na terra e a cabeça nas nebulosas poéticas. Hoje, aos 55 anos, orgulha-se de mergulhar as mãos no solo e tem certeza de que, todos os dias, escreve ou planta algo para ganhar mais anos sobre a terra. “Plantar ou criar uma poesia tem algo de querer permanecer. No fundo, o que a gente quer é derrotar a mote e ser lembrado pelo que fez.”

Fonte: Revista Vida Simples, n. 137, novembro 2013, p. 17. Texto de Júlia Duarte, Ilustração de Indio San

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Stephen King dá sequência a "O Iluminado"

Em Doctor Sleep, o mestre do terror resgata a história do personagem Danny Torrance, o menino que circulava de triciclo pelos corredores do Hotel Overlook




Com mais de 50 obras publicadas e 400 milhões de livros vendidos, Stephen King, tido como o mestre do terror, decidiu dar continuidade ao icônico O Iluminado com Doctor Sleep, um livro que retoma a história do personagem Danny Torrance 36 anos depois.

A sequência de O Ilu­­­­minado, que foi levada ao cinema por Stanley Kubrick com Jack Nicholson (Jack Torrance) no papel principal, foi lançada no dia 24 de setembro no mercado internacional, e será lançado no Brasil no ano que vem, pela editora Suma de Letras.
Escrito há mais de três décadas, quando o jovem King enfrentava sua terceira publicação, O Iluminado antecedeu a fama que seria alcançada pelo autor de um gênero que monopolizou com o lançamento de vários best sellers.

De 1977 até os dias de hoje, a vida de King mudou muito, assim como a do personagem da nova e bem-sucedida obra, Danny Torrance. “O protagonista nunca desapareceu da minha mente, tinha muita curiosidade por saber o que teria sido feito daquela criança. Estava muito nervoso perante a ideia de continuar o livro, mas era um desafio que me apetecia muitíssimo”, comentou o autor de obras como A Dança da Morte, Carrie, a Estranha e O Talismã.

Visões

Aquela criança que percorria o Hotel Overlook de triciclo se transformou em Doctor Sleep, um adulto com problemas alcoólicos e sem residência fixa, que vive atormentado por suas visões e os fantasmas de sua infância.

Neste aspecto, a história de Torrance chega a lembrar a de seu criador, King, que recebeu a notícia da publicação de seu primeiro livro pelo telefone de uma vizinha, já que, na época, o autor não tinha residência e vivia com sua família em um trailer.

Assim como o protagonista, o escritor americano também sofria de dependências, em seu caso, além do álcool, a cocaína, vício que ele conseguiu superar com o passar do tempo.

No entanto, a atormentada vida de Danny terá seu ponto de inflexão diante das visões de Abra Stone, uma menina perseguida por uma tribo de seres paranormais que se alimenta de crianças dotadas deste dom, algo que acabará levando Danny a ajudá-la.

Esse não foi o único livro que o autor decidiu resgatar nos últimos anos. Assim ocorreu com as obras Celular, Os Estranhos e O Apanhador de Sonhos, que retomaram os clássicos A Dança da Morte, Salem e A Coisa, respectivamente.

Esse é Stephen King, que vê como espectador a adaptação ao cinema de Carrie, a Estranha, mas que se mostra disposto a reviver as histórias que se amontoaram em sua cabeça, dando oportunidade aos leitores de compararem o novo e velho King.

Fonte: Gazeta do Povo, Caderno G

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Aos que não gostam de ler

Por Rubem Alves

“Nada tenho a dizer aos que gostam de ler. Eles já sabem. Mas tenho muito a dizer aos que na gostam de ler. Pena é que, por não gostarem de ler, é provável que não leiam isso que eu vou escrever. O que tenho a dizer é simples: “Vocês não sabem o que estão perdendo”. Ler é uma das maiores fontes de alegria. Claro, há uns livros chatos. Não os leiam. Borges dizia que, se há tantos livros deliciosos de serem lidos, por que gastar tempo lendo um livro que não dá prazer? Na leitura fazemos turismo sem sair de casa, gastando menos dinheiro e sem correr os riscos das viagens. Shogun me levou por uma viagem ao Japão do século XVI, em meio aos ferozes samurais e às sutilezas do amor nipônico. Cem anos de solidão, que reli faz alguns meses, me produziu espantos e ataques de riso. Achei que Gabriel García Márquez deveria estar sob o efeito e algum alucinógeno quando o escreveu. Lendo, você experimenta o assombro do seu mundo fantástico sem precisar cheira pó. É isso: quem lê não precisa cheirar pó. Nunca tinha pensado nisso. A poesia de Alberto Caeiro me ensina a ver, me faz criança e fico parecido com árvores e regatos. Agora, essa maravilha de delicadeza e pureza, do Gabriel velho com dores no peito e medo de morrer: Memórias de minhas putas tristes. Li, ri, me comovi, fiquei leve e fiquei triste de o ter lido porque agora não poderei ter o prazer de lê-lo pela primeira vez. Pena que vocês, não leitores, sejam castrados para os prazeres que moram nos livros. Mas, se quiserem, há remédio...”

Fonte: Retirado do livro “Do universo à jabuticaba” p. 189. 

sábado, 9 de novembro de 2013

Letras e artes

Hábitos curiosos de escritoras

  • Agatha Christie gostava de andar disfarçada.
  • Barbara Cartland passava batom e perfume antes de sentar-se à sua mesa de trabalho. Em sua própria casa.
  • Clarice Lispector foi ghost writer da modelo Ilka Soares.
  • Cora Coralina vendia banha de porco e linguiça.
  • Doris Lessing decidiu abandonar os estudos com 14 anos.
  • Emily Dickinson encadernava seus livros à mão.
  • J.K. Rowling gosta de escrever em locais públicos.
  • Simone de Beauvoir não tinha residência fixa: morava em hotéis e pardieiros.

Fonte: O Guia das Curiosas

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Neil Gaiman: o poder e o prazer da leitura

"Uma vez eu estava em Nova York e assisti uma palestra sobre o negócio de construir penitenciárias - uma indústria que cresce muito na América. Eles precisam planejar seu crescimento futuro - quantas celas vão precisar? Quantos prisioneiros vão estar na cadeia, digamos, daqui a 15 anos? E eles descobriram que conseguem prever isso muito facilmente, usando um algoritmo muito simples, baseado na porcentagem de crianças de 10 a 11 anos que não conseguem ler."

"Os Chineses promoveram sua primeira convenção de fantasia e ficção científica em 2007, eu estava lá. Perguntei, por que agora? Responderam: nós Chineses somos brilhantes para copiar os outros, mas somos fracos em inovação. Não inventamos nada, não imaginamos coisas novas. Então o governo mandou uma delegação aos EUA, para visitar a Apple, a Microsoft, o Google, e conhecer como eram as pessoas que estavam lá inventando o futuro. E todos eles tinham lido ficção científica, quando eram meninos ou meninas."

Com argumentos como esses, fica difícil resistir ao gentil manifesto de Neil Gaiman pela leitura, pelas bibliotecas, e principalmente pelo prazer de ler. Os parágrafos fazem parte de uma palestra que ele deu recentemente em favor da The Reading Agency, uma organização que promove a leitura no Reino Unido. É o cara certo para esta pregação. Neil Gaiman vive entre a alta literatura e o gibi, entre Borges e Hollywood, a mitologia e o rock'n'roll. Nunca sacrificou o apelo pop para impressionar a crítica. Escreve para crianças, adolescentes, adultos - frequentemente, ao mesmo tempo. Agora, colhe os frutos de um bem-sucedido romance "adulto"e semiautobiográfico para todas as idades, O Oceano no Fim do Caminho, e retoma os quadrinhos que fizeram sua fama com Sandman: Overture.

Neil, cinquentão, sempre de preto, ainda posa de rockstar dark-fofo e derrete as fãs. Mas devagarinho se converte em outro arquétipo: o velho sábio, sarrista e um pouco ranzinza, que tem muito a ensinar. Suas palavras são brisa suave que sopra pra longe o cinismo. Reproduzo sua preleção, em inglês, e não resisto a traduzir uns trechinhos.

"A ficção é uma porta para a leitura em geral. O impulso de querer saber o que acontecerá depois, de virar a página, de continuar, mesmo que seja difícil, porque alguém está com um problema e você quer saber como vai ser o fim da história - é um impulso muito real. E te força a aprender palavras novas, a pensar pensamentos novos, a continuar... e quando você aprende isso, está na estrada para ler tudo."

"A maneira mais simples de garantir que criaremos crianças alfabetizadas é ensiná-las a ler, e mostrar que ler é um prazer. Qualquer livro que elas curtam..."

"Ficção constrói empatia. Quando você vê TV ou um filme, está olhando coisas acontecendo com outras pessoas. Ficção em prosa é algo que você constrói com 26 letras e um punhado de pontuação, e você, só você, usando sua imaginação, cria um mundo e pessoas nele e olha através de outros olhos. Sente coisas, visita lugares e mundos... aprende que todas as outras pessoas lá fora também são um eu. Você está sendo outra pessoa, e quando volta ao seu próprio mundo, está ligeiramente transformado. Empatia é uma ferramenta para reunir pessoas em grupos, e permite que funcionemos como mais que um indivíduo obcecado por si mesmo."

"Ficção pode mostrar um mundo diferente. Depois que você visitou outros mundos... nunca mais estará inteiramente satisfeito com o mundo em que você cresceu. Insatisfação é uma coisa boa: pessoas insatisfeitas podem modificar e melhorar seus mundos, fazê-los melhores, transformá-los."

"Todos nós - adultos e crianças, escritores e leitores - temos obrigação de sonhar acordados. Temos obrigação de imaginar. É fácil fingir que ninguém pode mudar nada, que estamos em um mundo em que a sociedade é enorme e o indivíduo menos que nada: um átomo numa parede, um grão de arroz numa plantação. Mas a verdade é que indivíduos mudam o mundo o tempo todo, indivíduos fazem o futuro, e eles o fazem imaginando que as coisas podem ser diferentes."

Fonte: Portal R7, Texto de André Forastieri.